Os anfíbios são conhecidos por desenvolverem parte da vida na água (fase larvária) e parte em terra firme (fase adulta). Todavia, existem as mais diversas adaptações para os mais diversos ambientes. Muitos anfíbios possuem toda a vida aquática, enquanto outros, toda terrestre.
São conhecidos cinco “tipos” de anfíbios, reunidos em três grupos populares e vulgarmente denominados:(1) sapos, rãs e pererecas, (2) salamandrase (3) cobras-cegas. Às pererecas atribui-se o fato de grudarem em "qualquer" superfície, visto possuírem discos adesivos nas pontas de dedos e artelhos (Fig. 1, IA–B). Os sapos apresentam pele rugosa, grandes glândulas de veneno atrás dos olhos (glândulas paratóides), membros posteriores curtos e delgados (finos), focinho truncado e cabeça com cristas ósseas evidentes (Fig. 1, III C–F; IV G). As rãs possuem pele lisa, membros posteriores robustos e compridos e focinho pontudo (Fig. 1, IIA–C, IV).
As cobras-cegas (Fig. 2) apresentam o tronco (“corpo”) alongado, com anéis duros de queratina (uma proteína, igual a da nossa pele), não possuem membros e cinturas e são de coloração geralmente cinza azulada. São pouco conhecidas, já que têm hábitos fossoriais (vivem enterradas). Muitas pessoas as consideram répteis dotados de "veneno mortal", o que é um erro grave, já que são inofensivas. Tal confusão é atribuída à “semelhança” com répteis do grupo dos anfisbenídeos (cobras-de-duas-cabeças—mas há somente uma cabeça!) e serpentes. As salamandras (Fig. 2) são muito pouco conhecidas no Brasil (uma única espécie no norte do País—Bolitoglossa paraensis), mas podem ser comumente encontradas na Europa e America do Norte.
Estas designações populares, além de serem confusas, são insuficientes para classificar toda a diversidade de formas existentes, principalmente dentre os anuros (sapos, rãs e pererecas). Uma classificação mais apropriada para diferenciar estas três ordens de anfíbios seria a de se utilizar o aparelho locomotor como distinção fundamental, como segue abaixo:
(A) Urodelos (Urodela ou Caudata): são as salamandras e tritões. Possuem cauda, corpo alongado e pernas curtas (muitas perderam os membros anteriores e posteriores na evolução). Usam da ondulação lateral do corpo para andar em terra firme ("nadam em terra firme"); na água, se utilizam da ondulação lateral do tronco e cauda. No Brasil é conhecida uma única espécie, Bolitoglossa paraensis (SBH, 2007; informação capturada 21/XII/2007);
(B) Anuros (Anura): são os sapos, rãs e pererecas. Possuem especializações da cintura pélvica (bacia) e membros anteriores e posteriores para a natação e salto (veja estes detalhes na seção de anatomia!); também podem ser direcionadas para os atos de caminhar e escalar; não possuem cauda e o corpo é compacto. Correspondem a quase totalidade dos anfíbios brasileiros, sendo conhecidas no Brasil cerca de 813 espécies (SBH 2008; informação capturada 20/XII/2008);
(C) Gymnophiona: são as cobras-cegas. Não possuem membros e cinturas (veja estes detalhes na seção de anatomia!), dotados de corpo alongado e externamente segmentado. No Brasil existem 27 espécies (SBH 2008; informação capturada 20/XII/2008), incluindo espécies terrestres e aquáticas.
As relações de parentesco entre grupos e espécies de anfíbios têm sofrido grandes mudanças desde o ano de 2005, com novas propostas filogenéticas (relações de parentesco) e nomenclaturais (nomes dos grupos de anfíbios) sendo discutidas por diversos pesquisadores (p.ex., FAIVOVICH et al. 2005; GRANT et al. 2006; FROST et al. 2006; HEINICKE et al. 2007; CHAPARRO et al. 2007). A velocidade e quantidade de informações têm sido muito grandes e de difícil acompanhamento. Se você tem interesse especial neste assunto, um website útil para acompanhar estas e outras discussões seria o AmphibiaTree e o Tree of Life Web Project (web sites em inglês). A figura abaixo sintetiza as relações de parentesco dos três principais grupos de anfíbios (Fig. 3):
Podemos tentativamente destacar dentre os anuros (os representantes brasileiros mais ilustres dentre os anfíbios!) alguns poucos grupos taxonômicos (famílias). Os membros da família Hylidae, Centrolenidae e Hemiphractidae compõem praticamente todas as espécies de pererecas brasileiras e são muito aparentadas com nossas “rãs”. Os bichos conhecidos no Brasil por rãs, gias e caçotes pertencem a três grupos taxonômicos principais: os Terrarana (anuros de reprodução terrestre e de desenvolvimento direto; famílias Brachycephalidae, Craugastoridae, Eleutherodactylidae e Strabomantidae; ver para maiores detalhes HEDGES, DUELLMAN & HEINICKE, 2008) e às famílias Leptodactylidae e Leiuperidae. O termo rã foi aplicado historicamente às rãs do hemisfério norte, primariamente pertencentes ao gênero Rana (família Ranidae), representado no Brasil por somente uma única espécie (Lithobates palmipes; SBH 2007; informação capturada 01/I/2007). As nossas rãs ou gias, muitas delas utilizadas como alimento, pertencem a famílias distintas, mas os bichos mais conhecidos pertencem à família Leptodactylidae (p.ex., Leptodactylus vastus – rã pimenta; L. ocellatus – rã manteiga).
Os membros da família Bufonidae compõem todos os nossos sapos conhecidos como sapos-cururus. São aqueles sapos típicos de nossos jardins e pertencem ao gênero Rhinella—conhecidos por muitos no gênero Bufo, que não mais é utilizado para os sapos brasileiros (veja Fig. 1 III – Rhinella jimi). Contudo, há várias formas de anuros que são vulgarmente denominadas de “sapos”, mas que não o são verdadeiramente. Entre eles destaco o sapo-de-chifres (família Cycloramphidae, gênero Proceratophrys); o sapo-martelo ou sapo-ferreiro, que não é sapo e sim uma perereca (família Hylidae, espécie Hypsiboas faber); o sapo-boi ou intanha (família Ceratophryidae, gênero Ceratophrys); e o sapo-pipa, um animal aquático comumente encontrado no norte e nordeste brasileiros (família Pipidae, gênero Pipa).
E como fica a organização das famílias de anuros que ocorrem no Brasil? Abaixo, segue um resumo desta organização seguindo as relações de parentesco entre as famílias (Fig. 4). Para a montagem do cladograma abaixo me baseei em duas recentes publicações: FROST et al. (2006) e GRANT et al. (2006). Mesmo sendo uma sinopse, já que ressaltei somente as famílias que ocorrem no Brasil, é bastante complexo, já que, nas Américas, o Brasil é o País mais rico em anuros. Dê uma boa olhada e procure relacionar as famílias e animais citados no texto acima com as relações de parentesco conhecidas por ora.
Pro fim, vale atentar que os anfíbios constituem excelentes objetos para estudos em ANATOMIA, fisiologia, comportamento e ecologia. Poderíamos discorrer horas, dias, até mesmo meses sobre cada um destes assuntos. Todavia, fugiríamos do objetivo geral deste website, que consiste em apresentar a você uma primeira visão sobre os anfíbios. Ainda assim, você poderá fazer o download de uma apostila (parte) desenvolvida pelo autor desta página (NAPOLI 1995) contendo informações um pouco mais detalhadas sobre diversos assuntos (tegumento, esqueleto, sistemas e órgãos, comportamento, reprodução, ecologia e evolução) e direcionada a alunos do ensino superior, mas igualmente “digerível” para outros curiosos interessados no assunto. Todavia, note que a versão da apostila está desatualizada, principalmente no que concerne à evolução e filogenia! Na seção de ANATOMIA para anatomia] do Museu de Zoologia Virtual da UFBA, você poderá estudar, junto à caracterização do esqueleto dos anuros, as sinapomorfias que os caracterizam, isto é, as características osteológicas que são exclusivas e compartilhadas por todos os anuros.
É bastante comum confundir-se certos anfíbios com répteis. Entre as confusões mais freqüentes estão (1) a cobra-de-duas-cabeças (que não é cobra e tão pouco possui duas cabeças!) (Fig. 5), confundida com as cobras-cegas (Gymnophiona), e (2) os lagartos e lagartixas (Fig. 6), confundidos com as salamandras. As cobras-de-duas-cabeças (anfisbenídeos) são “lagartos” ápodes (sem membros) ou que reduziram consideravelmente seus membros, de hábitos fossoriais (vivem enterrados). São muito comuns no Brasil e podem ser facilmente diferenciados das cobras-cegas (anfíbios) pela presença de escamas pelo corpo, bem visíveis principalmente na cabeça, e cloaca transversal ao plano do tronco (Fig. 5), enquanto que as cobras-cegas têm anéis geralmente duros (queratina, uma proteína) em torno do corpo e cloaca longitudinal em relação ao plano do tronco. As cobras-cegas são dificilmente avistadas, habitando geralmente a serapilheira úmida de zonas florestadas. Logo, é mais provável que ao encontrarmos um espécime perambulando pela rua ou trilha, este seja um representante dos anfisbenídeos.
Os lagartos e lagartixas (répteis) têm escamas bem desenvolvidas em torno do corpo, unhas nas pontas dos dedos e cloaca transversal em relação ao tronco (Fig. 6), enquanto que as salamandras não têm escamas, não possuem unhas e apresentam cloaca longitudinal em relação ao plano do tronco, este último bastante segmentado pela presença de musculatura estriada responsável pelo movimento de ondulação lateral do corpo.